Despertou! Sem o sobressalto do despertador e nem de um pesadelo. Apenas abriu os olhos como se o sono nunca tivesse lhe alcançado naquela noite. Mas também lembrou que foi dormir exausto. Já sabendo que sofreria rigorosas consequências desse ato encorajou-se a olhar o relógio, com um dos olhos meio aberto e o outro fechado. Eram duas da madrugada. Se confortou em saber que teria mais quatro horas até o tempo de se levantar, mas se angustiou dado o quanto desperto se encontrava.

Virou para o outro lado da cama na certeza de que a posição que a cabeça ocupa no travesseiro era decisiva para voltar a dormir. Alguns minutos depois resolveu retornar para a posição original com a regra básica: Jamais abrir os olhos quando se tenta voltar a dormir! Abrir os olhos significava covardia na guerra contra a insônia. Quem esta acordado mantém os olhos abertos entre uma piscada e outra. Quem mantem os olhos fechados dorme ou esta morto.

Começou a pensar que se estava de olhos fechados e não estava dormindo e nem morto, desconfiou da própria regra. De pronto abriu os olhos para ter certeza de que estava vivo.Quebrou a regra e ficou perplexo com a própria fraqueza. Fechou os olhos com força, respirou fundo, dobrou os joelhos para o lado, puxou as cobertas para próximo do queixo e estava decidido a voltar a dormir. Mas lembrou que dormir não era decisão, mas uma entrega.

É um ato de muita coragem dormir, perder o controle de quem tanto vigia o dia, para não perder-se de si mesmo. Quem sabe não gostava do que via por dentro, não gostava da sua versão revelada, inquieta, insatisfeita. Associou que sua insônia tinha começado após uma série de noites com pesadelos em série. Definitivamente preferia olhar para fora, mas sem nada ver. No íntimo não gostava da própria vida, mas como já suspeitava não olhava para o íntimo fazia anos.

Tinha um medo enigmático de dormir e não acordar mais. Pensou em tomar um indutor do sono, não que fosse a favor de tomar remédios para dormir, mas até mesmo adultos precisam de uma musica de ninar vez ou outra. Mas não era a vida insatisfatória que lhe preocupava, mas sua insônia. Enquanto perdia tempo associando o sono com o medo da morte, em nenhum momento lhe ocorreu associar o sono com o medo de viver. Tinha que tomar uma atitude, a insônia era sua fiel mensageira, cuja a mensagem nunca chegava ao destino final.

Já era cinco e quinze da manhã e ensaiou um cochilo, acordou exausto com um único pensamento: que o dia passe depressa para que pudesse voltar para cama.A vida era uma longa espera por dormir e dormir era uma longa espera por não morrer.

Até que dessa penúria, a insônia dessa noite sussurrou uma ideia: não era a noite sua inimiga, mas a forma como vivia o dia. Ali também já não sonhava mais. Nem de dia, e nos últimos meses, nem de noite. Não estava vivo, nem morto. Cego, de olhos bem abertos. Vivo, de olhos bem fechados. Com o deciframento dessa mensagem era como se enfim a vida lhe tivesse alcançado. Decidiu despertar para poder sonhar. Despertou!

Eduarda Renaux

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